Personagens idiossincráticos, tipos excêntricos e um toque de surrealismo faziam-no crer que poderia estar, naquele momento, fazendo parte deste conto. Tal fato se agravou quando percebeu que fora designado a ele o papel principal do manuscrito e que, portanto, não poderia observar a cena com meros olhos de figurante.
Conseguindo desgarrar-se ligeiramente de súbito pensamento, viu-se diante de aproximadamente 5 pessoas, cujas expectativas, naquele momento, eram de que ele falasse algo, ao menos um singelo gesto com a cabeça para que alguém iniciasse, pois, a sessão. Afinal, aparentemente, fora ele quem convocara os que ali estavam.
Lançou mão de uma visão panorâmica àquela plateia, encheu o peito de ar como que se fizesse isso por obrigação e, ao desferir o inaugural "boa noite a todos", foi surpreendido por um hiperbólico toque de celular que desconcertou até mesmo o roteirista daquela cena, já que todos ficaram mudos, sem ação, esperando que o grafite fosse recolocado no papel, dando continuidade àquilo tudo.
O personagem principal se indagava sobre a possibilidade do acontecimento não passar de uma surpresa benéfica a ele, especialmente criada para inspirá-lo futuramente. Não, improvável. Tinha como grande desafio entender o que havia na cabeça do Criador daquele espetáculo: o que estava, de fato, fazendo ali? Qual era o intuito daquela reunião? Como chegariam a uma conclusão?
As demais pessoas pareciam ossos secos esperando pelo Sopro da Vida. Requintes trágicos de uma cena cômica.
O homossexual trejeitado sentado à direita parecia encantado. Sua mãe, viúva há 24 anos, dava indícios de estar enfrentando uma brava enxaqueca, tão desagradáveis eram suas feições. À frente, uma mulher que mais parecia um orangotango desatou a falar, dando indícios de que estavam todos ali para reclamar de algo, para sabatiná-lo, questioná-lo do porquê e a fórmula de sua felicidade perene. Sem citar a menina que estudava fora do condado e tinha em vez de olhos buracos negros. Tão negros quanto o pensamento do pseudo psicólogo ávido por recitar estrofes da "lei do psiu", deixando Camões e o "Os Lusíadas" a léguas náuticas de distância.
Deixou com que a espontaneidade do escritor ditasse suas atitudes e conduziu a reunião como estava acostumado a fazer. Aquilo, de fato, seria benéfico aos dois. Revelaram uns aos outros - desnecessariamente - diversas intimidades, acharam pontos em comum, desabafaram, enfim, colocaram o menu à mesa, cozinharam a conversa no fogo baixo e se alimentaram de uma sopa rala feita de imbecilidade, clemência e compaixão.
O sketch durou 40 minutos e 57 linhas. Ao mesmo tempo, ambos, escritor e personagem, iam embora satisfeitos...
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